Eis El Sangre

"Parece fácil demais".

Isso não saia da minha cabeça enquanto terminávamos de limpar o templo dentro do cemitério de WaterDeep. "Por quê, afinal, aquela velha precisava de nós 7 para fazer isso?", eu me perguntava. "Não faz sentido".

Minhas suspeitas se confirmaram ao sairmos do cemitério. Uma névoa muito densa encobria nossa visão. Aparentemente, ela havia tomado WaterDeep, de modo que não enxergávamos um palmo a frente de nossos narizes. Walter, que depois descobri ser um grande apreciador das artes arcanas (ao contrário de seu ignóbil companheiro humano), estava agitadíssimo, indicando que teríamos um encontro com o inefável.

Tentamos, em vão, nos livrar da névoa. Caminhamos a esmo por ela mas, aparentemente, todo passo que dávamos nos trazia de volta ao mesmo lugar. Além de nós, havia apenas um porto. E, nesse porto, Arthan verificou, um barco velho e assustadoramente mal conservado. Sem opções, caminhamos cuidadosamente em direção ao tal barco.

No comando da embarcação, estava a velha senhora que nos havia contratado. As coisas faziam menos sentido a cada passo que dávamos. Clotilde nos convidou a entrar e, sem outras opções, aceitamos.

O destino de nossa viagem era uma ilha bastante assustadora. Toda feita de cinzas, envolta numa névoa ainda mais espessa que a de WaterDeep, nessa ilha havia apenas e tão somente uma pequena capela. Nada mais no nosso campo de visão.

Descemos do barco e, talvez por medo, talvez por instinto, nosso bravo clérigo de Tempus se recusou a entrar na capela. O resto de nós não tinha nada a perder naquele momento. Entramos na pequena construção e fomos transportados para outro lugar. Atravessamos uma ponte também mal conservada e, do outro lado, avistamos apenas um pequeno morro e um trono.

Chegamos todos aos pés do trono e então a figura ali sentada se revelou. Um esqueleto com pedaços de carne por todo o corpo estava ali, olhando para nós. Quando seu olhar passou por mim, senti que estava lidando com um poder desconhecido até então. Certamente, aquele era um ser de porte divino. Aquele à nossa frente era um deus. Estávamos frente a frente com ZU-ZATAN.

Zu-Zatan apresentou-se para nós. Disse ser um deus caído e que precisava de nós para se reerguer. Zu-Zatan precisava de tempo para se reestabelecer e decifrar uma antiga profecia. Precisava de fiéis que o seguissem e o auxiliassem em seus planos. Precisava de guerreiros que lutassem por ele enquanto não pudesse fazê-lo ele mesmo. Precisava de nós.

Nenhum de nós tinha nenhuma vocação para o clericato. Nem tampouco éramos defensores de divindades. E, para falar a verdade, boa parte de nós sequer se importava com os deuses. Talvez isso tenha chamado a atenção de Zu-Zatan. Ao arrebanhar pessoas céticas como nós, não estaria roubando seguidores de outras divindades e, assim, não chamaria atenção dos outros deuses. Escondido nas sombras, Zu-Zatan conseguiria mais tempo para seguir com seus planos. Brilhante.

Zu-Zatan nos ofereceu poderes inimagináveis em troca de lealdade total. Uma troca justa, imagino. Em troca de nosso auxílio em sua jornada, o poderoso deus nos tornaria seus generais. Seríamos os seres mais poderosos caminhando sobre Faerûn. Exatamente o que eu desejava. Fui o primeiro a me ajoelhar e jurar lealdade a meu novo Senhor. Fui seguido por Fério, Úrsula, Arthan e Jin. Bruce preferiu não nos imitar. Preferiu continuar seguindo a Sylvanus. Talvez, um erro...

Zu-Zatan então nos nomeou El Sangre. Seríamos seus emissários em Faerûn. Teríamos a missão de reunir os livros, itens mágicos, generais, erguer as fortalezas e matar os inimigos necessários para a volta de Zu-Zatan. E assim o faremos.

Após esse encontro, acordamos novamente na taverna Suspiros da Noite, a mesma do encontro da noite anterior. Um "ES" marcado em nossas mão indicava que não havia sido um sonho. Éramos os guerreiros de Zu-Zatan na terra. Éramos seu braço terreno. Éramos El Sangre.

O Mal Começa

WaterDeep, a cidade dos esplendores. Milhares de aventureiros sedentos por ouro e glória andam por lá, atrás de qualquer migalha que possam engolir.

Tolos.

Minha jornada é diferente. Não busco ouro e glória, não busco ficar rico nem ser cantado em versos por todos os bardos de Faerûn. Não... para mim, isso é muito pouco. Klaus Larousse nasceu para brilhar. Nasceu para ser o mais poderoso ser que Faerûn já viu.

Mas, ironicamente, tudo começou como começam muitas das jornadas ditas heróicas: na mesa de uma taverna em WaterDeep.

Sentados à mesa estavam, além de mim, meu sempre fiel companheiro Fério; Bruce, um daqueles tolos seres que cultuam a natureza, e seu lobo Walter; um insuportável ladino chamado Arthan; um guerreiro deveras peculiar, vindo de terras além de Thay, de nome Jin; e Úrsula, uma meio-orc cujo temperamento definitivamente não combina com seu vigor físico. Se bem me lembro, havia um clérigo de Tempus conosco, mas seu nome se perdeu na minha memória. Mais tarde, ele viria a "desempenhar" um grande papel...

Uma vez reunidos e bem alimentados, uma velha senhora chamada Clotilde se aproximou e nos ofereceu algum dinheiro. Em troca, deveríamos destruir dois templos de deuses menores. Nunca me importei muito com deuses. Na verdade, nunca achei que um deus poderia afetar significativamente minha trajetória de vida. Como percebi mais tarde, essa foi uma das poucas vezes em que eu errei.

Arthan pronta e estupidamente se dirigiu à porta da taverna, indo em direção ao primeiro dos templos. Segui, acompanhado de Fério. Não porque quisesse de fato profanar um templo. Nem tão pouco porque desejava o dinheiro prometido. Mas sim porque percebi naquilo uma oportunidade única. Notei que havia chegado a hora de Klaus Larousse.

Meus companheiros não tiveram problemas para entrar no templo, porcamente disfaçardo como uma casa comum. Em termos de força física e habilidade, é difícil superar Jin, Arthan e Walter. Enquanto isso, Fério se encarregou de afastar os curiosos na rua. Já nos subterrâneos da casa, foi ainda mais fácil destruir o que restou dos fiéis. O fogo se encarregou de eliminar nossos rastros.

No caminho para o segundo templo, Fério deu cabo de alguns bêbados que resolveram importunar. Às vezes, mesmo um combatente sisudo e introspectivo como ele precisa de um pouco de diversão.

Entramos no cemitério de WaterDeep pela porta da frente, com o insuperável poder do dinheiro nos auxiliando no trato com o porteiro. Uma vez lá dentro, o massacre foi inevitável. E mais um (ou devo dizer menos um?) templo foi destroçado por nosso grupo. Simples, rápido e nem um pouco indolor. Exatamente como tem que ser.

Aviso aos de Mente Fraca

Essa é uma obra de ficção.
Nada do que está escrito aqui aconteceu realmente.
O que estiver escrito aqui não reflete necessariamente a opinião do autor.
É apenas um exercício de abstração, fruto de saudáveis sessões de RPG de um grupo de pessoas absolutamente normais, cujo único objetivo é se divertir nos sábados à noite.

E, convenhamos... se você realmente acredita que Faerûn é um lugar real e que magias e afins de fato acontecem, deveria desligar o computador e procurar ajuda médica.